Opinião

CARTAS de CABO VERDE – AQUI, UM LUGAR ( Parte II )
E afinal, os lugares não são todos estranhos? Mesmo aqueles que nos
davam sinais de normalidade… Seja lá o que isso for.
Um dia, não há muito, uma amiga confrontou-me com a permanente
desconfiança face aos poderes. A insinuação apontava para a minha constante conspiração contra os dirigentes políticos.
D´Aqui. “Não são todos iguais”, dizia-me.
Pois não, há uns mais iguais do que outros.
Olhamos em nosso redor, e o que vemos?
Corrupção, ódio, ataques pessoais, proteccionismo e promoção de família
e amigos, guerrilha comunicacional, lideranças maníacas, e tontos sem
humanidade, que fazem do seu pedestal um “play-ground”.
Está bem, não vemos. Ou vemos pouco. Tão pouco sabemos.
É o que está mais à vista nesta “época covidal”, como lhe chama um amigo.
A este período da história em que voltamos a animalizar. Parecemos bichos,
só nos falta voltar a comer com as mãos, e a ( isso já fazíamos ) escrever
com os pés. Não se trata afinal de conspirar contra os servidores públicos,
antes uma intolerância aos profissionais da política. Aqueles que deveriam preencher o item dedicado à profissão com militante partidário.
Quando eu vim para este mundo, Aqui, para este lugar… sabia pouco disto.
E o embate foi tremendo. Como uma cápsula lunar amarando.
Fui munindo-me das ferramentas necessárias para a adaptação.
Lembro-me de duas dicas em particular. De dois não nativos,
muito envolvidos na “fauna” local.
Um, o mais maduro, sabido, escorregadio como uma enguia, atirou-me.
“não penses que Aqui, neste lugar, se pode ter a veleidade da independência.
Bem pelo contrário. Tens que “cair” para um lado. O ideal é ir caindo. Como um
bote ao sabor da ondulação. Receber o mar, e ir na onda, ora para a esquerda,
ora para a direita. Sabes… as marés mudam.
Ah, mas eu como gosto de furar ondas. Tenho alma de “marinheiro”.
Com respeito pelo mar, contudo sem perder o olhar de fuso.
O mais jovem, qual cuidador avisado, descansou-me;
Isto, Aqui, não é nosso. É deles, não lhe tome as rédeas. Como quem diz, não
queiras “participar”. Não deixam. Como hoje os compreendo melhor, na altura
nada daquilo fazia sentido. Acontece que não sigo as suas recomendações.
Quando aportamos em terra estranha como Aqui, estranhamos como parece
óbvio… logo entranhamos, como deverá ser. E ao entranharmos tomamos
parte de, seguimos os sinais, dizemos que sim aos instintos, e eis-nos de volta