Opinião

Os meios de combate à violência doméstica
Seria possível desviar verbas e meios do combate à violência doméstica para os destinar ao combate ao tráfico de droga, numa sociedade dominada por fenómenos de mediatismo exacerbado?
Aquilo que tenho constatado numa análise baseada na experiência de muitos anos, é que podemos facilmente descortinar qual o tipo de droga em que alguém se viciou, pela idade que tem, mais ou menos como sucede com o nome das pessoas.
A droga deixa uma marca indelével não só naqueles que nela se viciam, como num círculo alargado de família que os rodeia, e na sociedade.
A droga deixa ainda marcas psíquicas que enformam todo o pensamento e relacionamento interpessoal.
Haverá perfeita noção de que a droga é responsável por uma parte muito significativa da violência entre casais, entre pais e filhos, netos e avós? Parece que não.
A moda nos meios de comunicação social, nas escolas, e em toda a sociedade, por consequência, é falar sobre a violência no namoro, no casamento, e sobre a igualdade de género. No tema da toxicodependência não é suposto falar, deixou de ser moda.
É verdadeiramente confrangedor que não haja um incremento dos meios no combate ao tráfico de droga e que, ao contrário, se perceba um desinvestimento no combate ao consumo e tráfico e na educação para uma juventude livre de drogas.
Pelo contrário, para o combate à violência doméstica, assiste-se, junto das autoridades policiais, de saúde, judiciais e de assistência social, à constituição de grupos de trabalho, equipas multidisciplinares, associações várias de apoio a vítimas, altera-se legislação a uma velocidade alucinante, como se a violência desaparecesse por decreto.
Nada tenho contra um combate aceso e empenhado ao fenómeno da violência doméstica, mas, lamento que seja à custa do esquecimento do combate a outro tipo de criminalidade, sobretudo porque é conhecida a enorme danosidade social causada pelo consumo e pelo tráfico de droga.
O alocar de uma infinidade de meios à violência doméstica é a causa directa de um enorme desinvestimento no combate aos crimes de consumo e tráfico de droga, quase parecendo que esse tipo de criminalidade desapareceu.
Acrescem os apelos a uma descriminalização dos consumos, passando para os jovens a ideia que consumir droga é coisa de pouca importância.
Com essa mesmo base de experiência, aquilo que posso testemunhar, é que são cada vez mais frequentes os surtos psicóticos em jovens, que, invariavelmente, consomem droga desde muito novos.
As personalidades bipolares e esquizofrénicas aparecem, não raramente, em jovens consumidores de drogas.
Acresce que a ajuda fornecida aos jovens e adultos viciados em droga, resume-se, as mais das vezes, à administração continuada, ao longo dos anos, de metadona, que, sem outro tipo de apoio psicológico e psiquiátrico, de nada serve.
Claro que o tráfico de droga gera lucros muito avultados e movimenta milhões, sendo difícil combate-lo.
Mas será sensato, ignorar que uma parte importante da violência intra-familiar, é gerada ou potenciada pelo consumo de droga?
Muitas mortes e maus tratos a mulheres, companheiras, mães e avós seriam evitadas se diminuísse o consumo de droga e álcool, mas, em termos mediáticos, não é esse o ponto fulcral da agenda.
E, portanto, dando satisfação a uma apetite voraz pela desgraça, não se noticia uma das principais causas dos actos de violência, mas tão só os actos de violência, são esses que chocam, que satisfazem o desejo pelo trágico e dramático.
Não há, contudo, qualquer esperança de combater a violência, se não for através do combate às suas causas.
Ignorando as causas e não as combatendo eficazmente estaremos a perpetuar o fenómeno da violência e de nada adianta criar comissões e grupos de trabalho.
A criação de tantas associações, a alteração da legislação, não tem feito diminuir a violência doméstica, e, portanto, talvez valha a pena pensar se o caminho é correcto.
De cada vez que há uma morte causada por violência intra-familiar, quase sempre contra mulheres, lá vem o apelo desenfreado de comentadores e opinadores contra um “sistema” que não protege as vítimas.
Desenganem-se, nem que houvesse um polícia à porta de cada casa e a vigiar cada família, a violência desapareceria, contudo, um combate mais acutilante e aguerrido às causas será, seguramente, um passo importante para a diminuição da violência.
A cada vez maior mediatização do fenómeno da violência doméstica, quando é feita, muitas vezes, sem qualquer cuidado ou rigor na transmissão da informação, só é potenciadora e serve de rastilho à violência.
Desejo que haja a capacidade de fugir ao politicamente correcto e que se assuma que reforçar o investimento no combate às causas da violência é a única maneira de a fazer diminuir.
O combate ao consumo e tráfico de droga é fulcral na tentativa de combater a violência.
Haja a coragem de o assumir e colocar na agenda esta “preocupação”, que parece esquecida por muitos.