Opinião

Uma espécie de pandemia – a esperança!
Os meus pais, pessoas pobres do alentejo e pobres é a palavra exata, quando todos dizem “humildes”, numa espécie de vergonha. Como se fosse…
Pode ser-se muito rico e ser-se humilde, mas pobre é não ter dinheiro (ponto final). A humildade não tem extrato social.
Sairam da terra já casados, no tempo que se namorava ao postigo. A terra deu-lhes uma enorme fortuna, mas não lhes dava pão. Trabalharam muito e juntavam “para um dia”… Passaram a ter comida na mesa onde, duas filhas se alimentavam com qualidade, mas onde só se enchia o copo do sumo uma vez.
Tive tudo, mas não tinha tudo. Era no dia Natal e no dia de aniversário que estreava uma roupa e chorei no dia que recebi uns ténis “de marca”.
As férias levavam-nos à “terra” carregados de comida da cidade, porque na “terra” só havia o que a terra dava. E que bom que isso era… sinto, ainda hoje, o cheiro a tomate e melancia fresca!
Viajei pelos livros e pela imaginação. Andava de avião quando sonhava ser hospedeira de bordo e emocionei-me quando vi a “Tour Eiffel” sem ser nas páginas das revistas.
Herdei esta capacidade de apreciar o que a vida dá. Herdei a palavra gratidão, sem cifrões ou partilhas de imóveis à mistura.
A minha herança é o que vivi e especialmente o que não vivi.
O que não vivi fez-me apreciar, de outra forma a conquista de uns sapatos que não tinham que ser estreados em dia de festa.
Cresci com a ideia muito segura daquilo que podia e não podia ter. Sempre aceitei comer lagosta, mas se alface é o prato principal, é degustado com a mesma satisfação.
À minha filha deixo herança semelhante de quem lhe vai dando tudo, com a certeza que esse tudo tem tanto de prazer como de trabalho. Ela já percebeu porque não é de palavras que vivemos e sim de exemplos.
Na vida precisamos de sorte, mas também de heranças grandiosas e estas não são de milhões de euros. Ter fortuna é a gratidão como aceitamos os desafios e a rejeição do papel de vitima daquela coisa maravilhosa que se chama “vida”.
Não ter saúde é, na minha opinião, a única coisa que nos pode levar à pobreza. Pobreza é morrer por falta dela, mesmo com muito ouro no banco. Essa é a pobreza maior!
A mim, restam-me umas unhas sem verniz gel, mas limpas e cortadas. “É o que é” e uma coisa não é melhor que a outra – é só diferente!
É este o tempo que vivemos e onde o mundo se vai dividir entre as pessoas que aceitam e as que irão chorar sempre pelas unhas partidas.
Aceitar é a coragem dos fortes, como a gratidão é o alimento dos que vencem!
Agarro-me à esperança, com o mesmo sorriso que penso nos sapatos, embora agora não os possa comprar, mas com a certeza que vou voltar a subir nuns saltos de 12cm.
Sorrir de ténis é tão bom quando se aprendeu que só assim faz sentido ver a vida.
Não é agora o fim de nada é apenas voltar à terra e namorar ao postigo para que o casamento dure, saudável a vida toda!